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Arqueólogo do Tempo

por Paulo Camargo*

 

José Antonio de Lima busca em detalhes esquecidos da cidade e em imagens da sua infância inspiração para telas e esculturas.

O artista plástico José Antonio de Lima gosta de dizer que faz, por meio de sua obra de pintor, uma espécie de arqueologia da cidade. Com olhos voltados para o chão, ele busca idéias e encantamentos em pequenos e quase imperceptíveis detalhes da paisagem urbana. Bocas de bueiro desgastadas pelo atrito de pneus, papéis amassados e a textura do asfalto e das calçadas são alguns dos restos esquecidos da metrópole que o inspiram na criação de muitas das telas presentes na exposição que inaugura hoje, às 19h, no Museu de Arte Contemporânea do Paraná, em Curitiba.
Se seu olhar inquieto vasculha a paisagem hiperreal, do cotidiano, no entanto, Lima também mergulha na sua infância, repleta de imagens rurais, quando produz esculturas. Puxando o fio da memória, ele empresta aos seus objetos – oito deles estarão na exposição – as formas dos balaios, cestos e casulos de insetos que povoam suas lembranças mais remotas, quando vivia no interior do Brasil.

Jornalista
Nascido na cidade mineira de Sacramento, Lima mudou-se para a pequena Grande Rios, no Paraná, ainda na infância. Começou a ensaiar, há mais de três décadas, os primeiros rabiscos e não sabe muito bem como e porque descobriu-se nesse ímpeto de colocar no papel, sob a forma de imagem, o que via ao seu redor.
“Naquela época era muito difícil conseguir informações sobre arte, ainda mais no meio rural, eu fazia porque gostava de desenhar figuras”, conta. Percebendo o talento do garoto, os comerciantes locais logo o chamaram para fazer algo útil com seu dom: escrever letreiros para açougues, farmácias e outras lojas da cidadezinha.
Essa preocupação com a praticidade acabou marcando a trajetória de Lima. Depois de mudar-se para Londrina, foi trabalhar numa agência de propaganda, a convite de um colega de supletivo que percebera seu talento para desenho. Mais uma vez, contudo, a sua vocação teve que esperar. Embora estivesse entusiasmado com as artes gráficas e pretendesse estudar Publicidade e Propaganda, a Universidade Estadual de Londrina acabou não abrindo o curso e Lima terminou se formando em Jornalismo, carreira que abraçou sem muita convicção, ele mesmo confessa, por muitos anos.

Geração
Em entrevista ao Caderno G, Lima contou que só foi assumir de vez sua vocação de artista anos mais tarde, em 1985, quando reduziu bastante seu volume de trabalho como jornalista e começou a freqüentar cursos e exposições, pesquisando técnicas e buscando seu meio de expressão.
“Talvez por ter começado meio tarde, já com mais de trinta anos, não pertenço a geração nenhuma. Sou artista meio isolado, não incluído nesses grupos que estão por aí”, constata.
Depois de flertar com a pintura mais figurativa, o artista acabou abrangendo as formas geométricas no seu trabalho bidimensional. Em suas telas, utiliza técnicas mistas que empregam pó de ferro e pigmentos, além de tintas a óleo e acrílicas.
Como escultor, Lima escolheu o papel reciclado como material-base de suas obras, que prefere chamar de objetos. É um material que permite múltiplas possibilidades e é bastante viável do ponto de vista econômico.
 
Gazeta do Povo, Caderno G, Curitiba, terça-feira, 9 de setembro de 1997.


*Possui graduação em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade Federal do Paraná (1989) e mestrado em Film Studies pela University of Miami (2002). Atualmente é doutorando do programa de Comunicação e Linguagens na Universidade Tuiuti do Paraná, onde é professor do programa de pós-graduação em Cinema. Também é repórter especial da área de cultura da Rede Paranaense de Comunicação e professor colaborador das Faculdades Integradas do Brasil.

 

1997
Pasta de papel e pó de ferro sobre tela
Paper and iron powder on canvas
150cm x 145cm

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